Vereador bolsonarista de Itaúna fanfarrona aprovação de projeto inconstitucional e de censura prévia à cultura no município

Publicado por: Redação

A Câmara de Vereadores de Itaúna aprovou um projeto que em seu preambulo dispões  sobre a vedação da promoção de temas relacionados a ideologia de gênero, sexualização precoce ou qualquer outro incompatível com a faixa etária dos alunos da rede pública ou privada do município de Itaúna, com vedação a palestras, peças de teatro, oficinas feiras, e distribuição de materiais, além de qualquer tipo de manifestação, em uma verdadeira censura prévia, a inexistente tecnicamente, ‘ideologia de gênero’ , que sofrerá patrulhamento de um ‘Conselho de Pais’, que poderá ser acionado, após qualquer diretor ou professor de escola entender que tal lei está sendo infringida  – Ocorre que,  a matéria é inconstitucional, assim definiu o STF em entendimento de um caso semelhante na cidade de Novo Gama, em Goiás. Com isso o prefeito Neider Moreira deverá vetar o projeto que é de autoria do vereador bolsonarista Caio Guimarães, que em rede social se vangloriou em ter aprovado o projeto de censura, e ainda inconstitucional. 

Em primeiro lugar, a nomenclatura “ideologia de gênero” é tecnicamente incorreta. Conforme se verifica nos mais recentes estudos acerca da sexualidade humana, o gênero não compõe uma ideologia da pessoa, mas sua identidade, ou seja, o modo como a pessoa se vê e gostaria de ser vista pela sociedade. Quando falamos de identidade de gênero estamos diante da interação entre o sexo biológico do indivíduo e sua autoidentificação mental.

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Em decisão recente, o Supremo Tribunal Federal proclamou a inconstitucionalidade de lei municipal que vedava a divulgação de material com conteúdo de “ideologia de gênero” em escolas municipais. O caso ocorreu em Novo Gama (GO), com a edição da Lei Municipal nº 1.516/15, a qual proibia a utilização de material didático com referência a ideologia de gênero na rede de ensino. Assim diziam os primeiros dispositivos da referida lei:

“Artigo 1º  Fica proibida a divulgação de material com referência a ideologia de gênero nas escolas municipais de Novo Gama — GO.
Artigo 2º  Todos os materiais didáticos deverão ser analisados antes de serem distribuídos nas escolas municipais de Novo Gama  GO.
Artigo 3º 
 Não poderão fazer parte do material didático das escolas em Novo Gama  GO materiais que fazem menção ou influenciem ao aluno sobre a ideologia de gênero.
Artigo 4º 
 Materiais que foram recebidos mesmo que por doação com referência a ideologia de gênero deverão ser substituídos por materiais sem referência da mesma”.

O projeto da Lei aprovada em Itaúna é bem similar ao aprovado em Nova Gamar, em Goiás.

A Câmara Municipal de Itaúna, Estado de Minas Gerais, decreta, e eu, Prefeito Municipal, sanciono a
seguinte Lei:

Art. 1º. Fica vedada, no âmbito escolar, a promoção de temas relacionados ao fomento a ideologia de
gênero, sexualização precoce ou qualquer outro incompatível com a faixa etária dos alunos da rede pública ou
privada do Município de Itaúna.

Parágrafo único – A vedação que trata o caput deste artigo abrange palestras, peças de teatro, oficinas, feiras, distribuição de materiais ou qualquer outra manifestação semelhante.

Art. 2º. Ficará sob responsabilidade dos Diretores das escolas municipais, bem como dos pedagogos,
a análise prévia dos conteúdos que serão ministrados aos estudantes, cabendo a eles analisar os temas que serão
abordados e se os mesmos são compatíveis com a faixa etária dos alunos que serão expostos ao conteúdo que
será apresentado no âmbito escolar.

Parágrafo único – Fica facultado aos diretores e pedagogos, convocar previamente o conselho de
pais a fim de apresentar o conteúdo dos temas que serão abordados e apresentados aos estudantes da rede
municipal.

Art. 3º. Os profissionais e instituições de ensino que não observarem a vedação que trata o artigo 1°
desta lei, bem como a compatibilidade entre a faixa etária dos estudantes e dos temas apresentados serão
responsabilizados administrativamente, sem prejuízo de demais sanções previstas em lei.

§ 1º. Em caso de descumprimento da vedação imposta caberá as seguintes sanções administrativas
aos funcionários da Rede Pública de Ensino Municipal, conforme determina o art. 124 da Lei n° 2.584, de 11 de
dezembro de 1991:
I – Advertência;
II – Suspensão;
III – Demissão;
IV – Destituição de cargo em comissão;

§ 2º. Em caso de descumprimento da vedação imposta caberá as seguintes sanções administrativas as
instituições de ensino privadas que descumprirem a vedação imposta pelo artigo 1° desta lei:

I – Multa no valor de 25 (vinte e cinco) Unidades Fiscais Padrão – UFP do Município de
Itaúna, sendo essa aplicada em dobro em caso de reincidência;
II – Suspensão do alvará de funcionamento;
III – Cancelamento do alvará de funcionamento;

§ 3º. O processo administrativo disciplinar de apuração de descumprimento da vedação imposta pelo
artigo 1° desta lei observará o devido processo legal e o contraditório, devendo ser aplicada as punições em
observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Art. 4º. As despesas decorrentes da execução do disposto nesta lei correrão por conta de dotações
orçamentárias próprias, suplementadas, caso necessário.

Art. 5º. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Itaúna, Minas Gerais, 06 de Setembro de 2023.

Kaio Augusto H. A.

Vereador

Guimarães Ener Batista
Vereador

 


Depois de ajuizada ADPF para verificação de sua constitucionalidade, entendeu a Corte Constitucional que a lei municipal apresentava inconstitucionalidade nos aspectos formais e materiais. Há inconstitucionalidade formal em função da CF, artigo 22, XXIV e seu parágrafo, segundo os quais os municípios não possuem competência para legislar sobre conteúdo programático e assuntos pedagógicos.

“Artigo 22  Compete privativamente à União legislar sobre:
XXIV 
 diretrizes e bases da educação nacional;
Parágrafo Único. Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo”.

De igual forma, a CF, artigos 24, IX, e 30, II, determinou a prevalência de União, estados e Distrito Federal quanto à competência para estabelecer normas sobre educação e ensino, conferindo competência suplementar residual para os municípios no que lhe couber.

“Artigo 24  Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
IX 
 educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação.
Artigo 30 
 Compete aos municípios:
II 
 suplementar a legislação federal e estadual no que lhe couber”.

Foi precisamente no exercício de sua competência constitucional, que a União editou a Lei nº 9.394/96 — Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), a qual não trouxe nenhuma vedação acerca da divulgação e utilização de material com conteúdo de ideologia (identidade) de gênero em escolas públicas. A Lei Municipal n° 1.516/15, portanto, ao proibir a utilização e divulgação do material, exorbitou de sua competência suplementar e estabeleceu novos parâmetros de utilização de material didático, caracterizando interferência inconstitucional no conteúdo programático das escolas do Sistema Nacional de Educação (CF, artigo 214 c/c. Lei nº 13.005/14) e inobservância da Lei de Diretrizes e Bases.

Por se tratar de matéria que afeta toda a rede de ensino, não poderia a Constituição Federal permitir que cada município legislasse à sua maneira, vedando ou autorizando determinado conteúdo programático. Se assim o fosse, estaríamos diante de uma distorção do caráter universalizante do ensino, fazendo com que alunos de alguma região do país ficassem alijados do conhecimento compartilhado com os demais.

A competência legiferante suplementar conferida aos municípios pelo artigo 30, II, da CF, diz respeito a especificidades locais, adaptando o acesso do aluno às peculiaridades da região, quanto ao ensino e a difusão do conhecimento. Referido dispositivo constitucional não pode ser interpretado como licença para suprimir temas da matriz curricular federal, muito menos para autorizar legislativos municipais a proibir a veiculação de material que a União e os estados não vedaram.

“Desse modo, os municípios não dispõem de competência legislativa para a edição de normas que tratem de currículos, conteúdos programáticos, metodologias de ensino ou modos de exercício da atividade docente” [2].

Por seu turno, a inconstitucionalidade material se deu porque a lei municipal confrontou os dispositivos da CF, artigo 206, II e II, referentes à liberdade na relação de ensino/aprendizagem e no pluralismo de ideias que devem nortear os assuntos educacionais.

“Artigo 206  O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
II 
 liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
III 
 pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino”.

Proibir determinado conteúdo de ser ministrado em sala de aula caracteriza censura prévia imposta por um grupo menos numeroso de parlamentares no sentido de privar o acesso ao conhecimento e interferir na liberdade de cátedra dos professores.

Nos dias atuais. a identidade de gênero é reconhecida como elemento constitutivo da psique humana, sendo essencial para o desenvolvimento da personalidade e identidade dos indivíduos, e a mitigação do seu conteúdo em sala de aula rompe com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (CF, artigo 1º, III) [3].

“O reconhecimento da identidade de gênero é, portanto, constitutivo da dignidade humana. O Estado, para garantir o gozo pleno dos direitos humanos, não pode vedar aos estudantes o acesso a conhecimento a respeito de seus direitos de personalidade e identidade” [4].

Sob permanente supervisão de especialistas e acompanhamento da constante evolução dos estudos sobre Educação, Sociologia, Psicologia e comportamento humano, e abandonado tema como bandeira ideológica para tomada de poder político, com a seriedade e a responsabilidade que a questão demanda, a identidade de gênero nada mais é do que o reflexo de uma sociedade justa e igualitária, cujo pilar de sustentação reside na dignidade humana e no respeito à liberdade de autodeterminação de cada um.

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comentários

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  1. Mário Celso de Oliveira e Nogueira disse:

    Concordo plenamente com a câmara de vereadores de Itaúna, por pensar em nossa população infantil, se queremos ter um futuro melhor vamos cuidar de nosso jovens desde agora, não importo por me criticar pena minha opinião
    Grato e boa noite

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