Segundo uma matéria publicada pela Folha, o Comando do Exército vai repassar R$ 4 milhões para 50 generais como ajuda de custo para mudar de cidade. O benefício, na prática, é recebido por militares de alta patente como penduricalho para aumentar salários – Os valores variam de R$ 12,4 mil a R$ 151,1 mil por general —média de R$ 81,5 mil para cada um. O Exército ainda envia verba extra ou contrata caminhões para o transporte dos bens pessoais dos militares por fora da ajuda de custo – O recurso, previsto em lei, é repassado para todo militar quando ele é transferido de cidade. As movimentações costumam ocorrer a cada dois anos.
Apesar de ser classificado como uma ajuda de custo, o recurso não é calculado com base nas despesas exigidas para a mudança de local de trabalho —o único fator é o salário. Na prática, a verba acaba inflando as remunerações do topo da carreira em benefício que opõe oficiais a praças.
Ao todo, 71 generais trocaram de cargos. Levantamento feito pela Folhamostra que 50 desses militares receberão recursos, enquanto outros 19 não tiveram direito por permanecerem na mesma cidade; outros dois generais vão se mudar, mas o Portal da Transparência não detalha registros de recebimento.
A lei estabelece que o militar com dependentes deve receber duas vezes o valor de remuneração como auxílio a cada movimentação em que haja mudança da organização militar.
Se a origem ou destino for uma cidade considerada de categoria A, cujo deslocamento é mais complexo, o valor sobe para quatro vezes o salário do militar. O dinheiro será cortado pela metade se o beneficiário não tiver filhos.
O general Francisco Wellington Franco de Souza, duas estrelas, é quem receberá o maior valor: R$ 151,1 mil. Ele sairá da chefia do Estado-Maior do Comando Militar do Norte, em Belém (PA), para a chefia de Material de Aviação do Exército, em São Paulo (SP).
Outros dez generais vão receber recursos acima de R$ 100 mil.
O general Marcus Vinicius Gomes Bonifácio, também de duas estrelas, vai acumular o segundo grande repasse em 12 meses. Ele foi enviado para Macapá (AM) no fim de 2022 para chefiar a 22ª Brigada de Infantaria Motorizada e, agora, vai se mudar para o Rio de Janeiro (RJ) para comandar a Aman (Academia Militar das Agulhas Negras).
No ano passado, ele recebeu R$ 109,5 mil como ajuda de custo para trocar de cidade. Dessa vez, o valor que terá acesso é de R$ 146,5 mil.
Em comparação, parlamentares têm direito a ajuda de custo de R$ 40 mil no início e no fim da legislatura, a cada quatro anos, para auxiliar as mudanças para Brasília.
A maior ajuda de custo é dada ao militar quando vai para a reserva. O valor, estabelecido por lei, é de oito vezes o último salário de seu último posto —saldo que chega a R$ 300 mil em caso de generais quatro estrelas.
O benefício foi dobrado pelo Congresso, em acordo com o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), na votação da reforma da Previdência dos militares, em 2019.
Generais ouvidos pela Folha afirmaram, sob reserva, que o pagamento serve como uma espécie de FGTS para os militares.
O fundo, no entanto, foi criado para que trabalhadores de carteira assinada tivessem uma garantia de recursos em caso de demissão, numa alternativa à estabilidade no emprego. Por isso, servidores públicos em regime estatutário não têm direito ao FGTS.
Em 1º de dezembro, o general Estevam Theophilo foi para a reserva do Exército e deixou o Comando de Operações Terrestres. Ele é membro de uma das famílias mais tradicionais da Força, cujo início das atividades remonta ao Brasil Império.
Os valores repassados a Theophilo, porém, não estão detalhados no Portal da Transparência. Em casos de acúmulo de benefícios, o valor pode saltar a quase R$ 1 milhão —no caso do general Tomás Paiva, comandante do Exército, os valores somados chegaram a R$ 770 mil.
“O Centro de Comunicação Social do Exército Brasileiro informa que todas as movimentações com ajuda de custo e transporte seguem a legislação vigente e reafirma o compromisso da instituição com o combate à desinformação, com a legalidade e com a transparência na prestação de informações à sociedade brasileira”, disse o Exército em nota.
Militares ouvidos pela Folha reclamaram do fato de as tabelas que definem os valores para o transporte dos bens dos oficiais estarem defasadas. Os preços não são atualizados desde 2011.
Nesse caso, os militares que escolhem fazer a mudança por meio da contratação de caminhão recebem um valor aquém do necessário —e, por isso, precisam desembolsar recursos próprios para bancar os gastos.
Eles ainda afirmam que a ajuda de custo serve como atratividade na Força, já que a carreira é cheia de percalços, com mudanças constantes de cidade, e a instabilidade da profissão causa prejuízos às famílias.
Na visão deles, o benefício ainda compensa o fato de militares não receberem pelas horas extras trabalhadas. É dinheiro importante ainda para reorganizar a vida de filhos, com matrícula em escolas.